quinta-feira, 25 de junho de 2009

CHAVES DO BICICLETÁRIO (CACILDA)


E se servissem os beijos apenas para exprimir a falta, a saudade, o toque visual ou o futuro calado em que Cacilda, a bicicleta, se mantem há dois mil e nove anos no bicicletário da garagem?
Pedalo na hora precisa de ir ao subsolo. As escadas buscam o íntimo dos ventos. Assim, com garrafa de água, o calor trinca os cimentos das calçadas, as praias das ruas. Há ilhas humanas por todos os lados. Saio do apartamento.
A normalidade do caos constrói os olhos pétreos de Robedval, o porteiro. Peço-lhe a chave. Lento a pingar suores pelas narinas, pescoço e com mancha no sovaco entrega-me o artefato de metal. É como se o meio-dia saísse da meia-noite e a meia-noite girasse na fechadura do meio-dia. A porta emperrada abre-se.
E lá dentro, entre outras bicicletas, Cacilda dependurada na parede, atenta e distante, presente e mergulhada em mar de sombras. Faço-lhe confidências depois das carícias velozes.

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